terça-feira, 11 de agosto de 2009

Livro: "A Cabana" - Uma análise da sua teologia.




Não é fácil falar sobre livros, e criticar é mais fácil do que construir, mas o livro "A Cabana" editado pela editora Sextante, no Brasil, me parece ser um caso mais sério e digno de uma avaliação critica. É dito ser uma "ficção evangélica" , mas as pessoas que gostam desse tipo de literatura levam a sério (e muito a sério) as invencionices extra-biblicas descritas nesse tipo de literatura. Só como exemplo, cansei de ouvir cristãos falando que "tem um anjo agora aqui em cima do meu carro me guiando", imagem essa construida pelo livro "Este mundo tenebroso". Mas vamos lá. Eu gostaria de comentar esse livro do ponto de vista da doutrina, daquilo que ele ensina sobre Deus e os homens.

Para dar um pano de fundo, Deus é uma mulher negra, Jesus é um jovem de jeans, camisa azul-clara, olhos castanhos, bigode e barbicha, muito desligado e sonhador e o Espirito Santo é comparada a uma mulher oriental (não era pra menos, já que os orientais são sempre mais misticos que os ocidentais). O estranho é que Deus, uma mulher, é chamada de Papai. Eles vivem numa cabana (local onde foi morta a filha de Mackenzie - um dos personagens principais). Esse encontro de Mackenzie (representa o ser humano) com Papai, Jesus e Sarayu (o Espirito Santo) é que é o enredo do livro.

Os pontos teológicos que eu gostaria de salientar e que eu particularmente não concordo:
  1. 1 -A trindade é sempre mostrada como sendo pessoas que estão meio que 'surpresas' com tudo o que acontece no mundo. Ou seja, Deus não tem nada a ver com o que aconteceu à Mackenzie (perda da filha). Eles inclusivem não sabem detalhes da própria familia de Mackenzie, e , apesar de serem conhecedores de tudo, a trindade 'por amor' se limitou a si mesmo, ignorando a verdade. Ficam surpresos, alegres, ou tristes, se entreolham a medida que Mackenzie fala. Veja o seguinte trecho:" Nós nos limitamos por respeito a você. Não estamos trazendo à mente, por assim dizer, nosso conhecimento sobre seus filhos. Ouvimos como se fosse a primeira vez..." (pág 97).

  2. 2 - A figura presente é sempre de um Deus meio "indeciso", como se fosse humano. A expressão que aparece diante de uma questão de Mackenzie é "acho que ...". Ou seja, um Deus que "acha que" demonstra um Deus mais para ser semelhante a um homem do que superior a ele. Isso vai de encontro a idéia corrente de Deus como sendo semelhante ao homem, porém um pouco mais sábio e mais velho.
  3. 3 - Sobre pecado, o autor propala a idéia comum de que não tem punição para o pecado, já que o erro que se comete já se paga aqui: " Não sou quem voce pensa, Mackenzie. Não preciso castigar as pessoas pelos pecados. O pecado é o próprio castigo, pois devora as pessoas por dentro" (pg 109).
  4. 4 - Igualdade entre Deus e os homens é outro ensino desse livro. Dificil acreditar que somos iguais a Deus. " ... Mack, queremos compartilhar com voce o amor, a alegria, a liberdade e a luz que já conhecemos em nós. Criamos voces, os humanos, para estarem num relacionamento de igual para igual conosco e se juntarem ao nosso circulo de amor".
  5. 5 - Relacionamento é aceitar o outro mesmo quando suas escolhas não são úteis nem saudáveis. Acredito que é parcialmente verdadeiro para os seres humanos, mas isso não se aplica à Trindade, como o autor quer colocar.Veja o que Jesus disse quando estava falando do relacionamento ideal entre ele, Deus e o Espirito Santo.: " Os relacionamentos verdadeiros são marcados pela aceitação , mesmo quando suas escolhas não são úteis nem saudáveis. " (pág 132).
  6. 6 - Sobre submissão ele afirma: "Submissão nada tem a ver com autoridade, e não é obediência. Tem a ver com relacionamentos de amor e respeito. Na verdade somos (a trindade) igualmente submetidos a voce (Mackenzie)". Pg 133. Ou seja, Deus se submete ao homem ! É o ideal de todo ser humano decaido ter um Deus que se submeta a ele !!
  7. 7 - Sobre homens e mulheres, Jesus (do livro) disse que: "o mundo, em vários sentidos, seria muito mais tranquilo e gentil se as mulheres governassem (em lugar do homem)" pg.135. Parece contrário ao que ensina a Biblia, quando cita como castigo que mulheres e crianças governarão sobre Israel, quando Israel pecasse.
  8. 8 - Instituições. Mack perguntou sobre isso. O que disse Jesus (do livro)? "Eu não crio instituiçoes. Nunca criei e nunca criarei.... o casamento não é uma instituição. É um relacionamento...Essa é uma ocupação dos que querem brincar de Deus. Portanto eu não gosto muito (?) de religiões, e também não gosto de economia e politica... essas coisas são ferramentas terríveis que muito usam para sustentar suas ilusões de segurança e controle" (pg. 168).
  9. 9 - Reconciliação é com o mundo inteiro? Respondeu Papai: "Com o mundo inteiro, Mack. Estou dizendo que a reconciliação é uma rua de mão dupla e eu fiz a minha parte, totalmente, completamente, definitivamente. Não é da natureza do amor forçar um relacionamento, mas é da natureza do amor abrir o caminho" (pg 180). Cabe ao homem escolher o caminho que quer seguir (e também a força e a responsabilidade para isso). Será assim?
  10. 10 - Deus está em todo lugar e em todas as coisas (panteísmo): Mack perguntou se veria de novo a Deus. Resposta:"Claro. Voce pode me ver numa obra de arte, na música, no silencio, nas pessoas, na criação, mesmo na sua alegria e na sua dor". Pg 185.
  11. 11 - Sobre se devemos ou não obedecer a lei de Deus, Mack perguntou se não precisava seguir regras ou leis. A resposta foi de que não precisava, pois "em Jesus voce não está sob NENHUMA lei". Mas adiante Mack pergunta: "É por isso que gostamos tanto da lei? Para nos dar algum controle?" Respondeu Sarayu: "ela (a lei) dá o poder de julgar os outros e de se sentir superior a eles...eu gosto demais da incerteza...as regras não podem trazer liberdade. Elas só tem o poder de acusar". Pergunto: será que devemos abandonar os 10 mandamentos?
  12. 12 - Uma pessoa que está sem o perdão de outra pessoas, se "alimenta do seu sofrimento", ou seja, se voce não perdoa, aquela pessoa está se alimentando de voce. Deve ser uma espécie de autofagia mental!! Inclusive os mortos também perdoam quem os matam (no livro é o que faz a menina morta pelo bandido). Devemos declarar o perdão em voz alta porque "há poder no que meus filhos declaram", diz Papai. Pag 210 e 211.
Bem, agora uma palavra final: o livro é interessante do ponto de vista da ficção literária e a pessoa que escreveu tem alguns conhecimentos sobre o cristianismo. No entanto, a lista de coisas que não são verdadeiras em termos de teologia torna-o um livro PERIGOSO, pois pode levar as pessoas a aceitar e acatar seus ensinos. Do ponto de vista teológico, posso dizer que é ruim, já que o livro vai ao encontro da teologia reinante na atualidade, que é absolutamente humanista. Talvez, infelizmente, seja essa a razão do 'sucesso' dele entre cristãos.

Se eu fosse resumir a teologia do livro, resumiria na frase colocanda no topo da página 79, de Jacques Ellul: "...não importa qual seja o poder de Deus, o primeiro aspecto de Deus jamais é o do Senhor absoluto, do Todo-Poderoso. É o do Deus que se coloca no nível humano e se limita". Ou seja, um absurdo completo.

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